O economista acaba de concluir um novo trabalho, intitulado Previdência Social – uma agenda de reformas com o economista Paulo Tafner, em que trata da evolução do sistema no Brasil e oferece sugestões para reforma. A seguir, os principais trechos da entrevista.
Quais as principais fragilidades do sistema previdenciário brasileiro?
A fragilidade decorre do fato de que um problema universal, de natureza fiscal associada à tendência de envelhecimento da população – fenômeno muito positivo do ponto de vista social que, sem dúvida nenhuma, tem impactos fiscais relevantes – é potencializado no Brasil devido à benevolência de nossa legislação em relação ao resto do mundo.
O IBGE projeta envelhecimento expressivo da população nos próximos 30 anos. Que impacto isso terá na Previdência?
Vai depender do crescimento do País. Embora seja correto imaginar que, com crescimento forte da economia, poderíamos viver mais 30 ou 40 anos sem reforma, há duas coisas importantes que devem ser consideradas. Primeiro, mesmo que não haja problemas de sustentabilidade, as regras de aposentadoria do Brasil são extremamente generosas. As mulheres, no Brasil, por exemplo, se aposentam por tempo de contribuição em média aos 50 anos de idade. Isto significa que um País com enormes carências como o nosso se dá ao luxo de gastar uma quantia crescente com aposentadorias de pessoas que, no resto do mundo, teriam de trabalhar ainda entre 10 e 15 anos para poder se aposentar.
Ao mesmo tempo, a expectativa de vida das mulheres cresce… Está aumentando. Em segundo lugar, é necessário saber se, sem uma reforma, seremos capazes de manter o ritmo de crescimento com baixos níveis de investimento em um contexto em que a população economicamente ativa vai estagnar. Em 2010, o número de pessoas entre 15 e 59 anos foi de 125 milhões. A estimativa do IBGE é de que em 2050 caia para até 123 milhões. Ao mesmo tempo, o contingente com 60 anos ou mais, que em 2010 foi de 19 milhões, em 2050 será de 64 milhões. É um desafio maiúsculo. Todo o crescimento do PIB nos próximos 40 anos terá de vir de produtividade, já que o número de pessoas que estarão contribuindo para gerar este PIB, na fase ativa, será similar ao atual. Tenho dúvidas se o País vai sustentar crescimento médio, por 40 anos, de 4,5% ao ano.
Estamos atrelando o bem-estar do sistema previdenciário a uma premissa inconstante?
Seria interessante recuperar um pouco o noticiário internacional sobre a Grécia na época da adesão ao euro, quando o país era louvado pela sua aceitação dos princípios positivos, com comprometimento com metas fiscais, baixa inflação etc. A economia brasileira é muito mais forte e dinâmica do que a grega. Mas, o sistema previdenciário brasileiro, sem dúvida, é nosso lado grego.
Que medidas o sr. propõe para a reforma?
Basicamente, trata-se de aprovar medidas como a adoção de regras mais duras para os futuros trabalhadores, que ainda não ingressaram no mercado de trabalho, e cuja expectativa de vida, realisticamente, para quando forem se aposentar, se aproxime de 85 anos e 90 anos.
O que seriam regras mais duras?
Estabelecer regra de transição para aqueles que já estão no mercado de trabalho, que torne a idade de aposentadoria tão mais próxima da regra futura quanto mais jovem for a pessoa; e tão mais próxima da regra atual quanto maior o período de contribuição já realizado. Que se adote uma regra para as pensões semelhante à de muitos países em que o instituto da pensão é reconhecido como símbolo de solidariedade, mas mitigado pelo fato de que a pensão é inferior a 100% do benefício original. A não ser em casos em que o cônjuge, viúvo ou viúva, tenha filhos menores. E uma extensão do período contributivo de quem se aposenta por idade, que hoje é de 15 anos, pequeno em comparações internacionais, e deveria ser estendido para algo em torno de 25 anos, com transição de 20 anos.
Uma transição longa…
Estamos falando de regras com longas transições que, mesmo assim, deixariam o Brasil com parâmetros de aposentadoria mais generosos que os do resto do mundo. São propostas que não têm nada de draconianas e deveriam ser encaradas com realismo pelos partidos.
Qual o pior cenário se nada for feito?
O risco é ter de fazer uma cirurgia sem anestesia, se no futuro nos encontrarmos em dificuldades fiscais e tivermos de mudar as regras de forma súbita, sem nenhuma transição, como estão fazendo os gregos, de forma dramática, e a Argentina, tendo que diminuir as aposentadorias acima de determinado valor.
É preciso uma campanha para a população entender uma futura reforma?
Uma nova reforma previdenciária, abrangente, deverá ser precedida da maior campanha institucional desde o Plano Real, que foi perfeitamente compreendido pela população.
A reforma da Previdência pode entrar na pauta neste governo? Há uma espécie de “síndrome do avestruz”: mergulha-se a cabeça na terra, como se o problema não existisse. Há até interpretações exóticas de que a Previdência é superavitária. Na verdade, não é para uma questão contábil, e sim física. Vamos ter, daqui a 40 anos, aproximadamente 3,5 vezes o número de idosos que temos hoje.
Alessandra Saraiva