Vamos voltar ao assunto dos aposentados, que precisa ser debatido por Dilma e Serra. Matéria de Gilberto Scofield, manchete principal de O Globo recentemente, assinalou que 100 milhões de brasileiros, quase a metade da população vivem com dinheiro público, procurando dar ideia de que tal fato significa uma concessão, e não um direito, na verdade uma retribuição de contribuições previdenciárias e impostos pagos.
O repórter equivocou-se na análise que tentou fazer, considerada pelos editores do jornal como uma descoberta singular. Baseou-se em opinião do economista Raul Veloso que lançou sobre a questão social a visão mais conservadora possível. Não é nada disso. Começando pelas aposentadorias e pensões.
Tanto a dos trabalhadores celetistas, paga pelo INSS, quanto a dos funcionários públicos, custeada pela Seguridade Social. O que o professor Raul Veloso não disse a Scofield foi que a massa de recursos destinada à Previdência Social provém de contribuições dos trabalhadores e das empresas empregadoras. Estas recolhem 22%, sem limite, sobre as folhas de salário. Sustentam 75% dos pagamentos feitos pelo INSS. Isso de um lado.
De outro, portanto, as aposentadorias resultantes de tais contribuições não são favores, são direitos. O mesmo quanto aos funcionários públicos federais, estaduais e municipais. Pagam 11% ao mês sobre seus vencimentos, também sem limite, para o direito à aposentadoria integral. A do INSS tem o teto fixado em 3 mil e 473 reais. Exceto aquelas excepcionais em grande parte obtidas por meios fraudulentos. Vários jornalistas estão nessa. São falsos perseguidos.
Gilberto Scofield e Raul Veloso cometem outro erro enorme ao colocar o aumento do salário mínimo como um encargo do governo. Não é. O país, segundo o IBGE, possui uma mão de obra ativa de 95 milhões de pessoas, Cinquenta por cento do número de habitantes. Desse montante apenas 6 milhões são servidores públicos. Logo, 89 milhões são empregados particulares. Deste total – ainda de acordo com o IBGE – 27% ganham o salário mínimo. Quem paga o salário mínimo? Os empregadores particulares.
De todos os itens relacionados pela reportagem, doação é somente o caso do Programa Bolsa Família. Este sim. Através dele são distribuídas 12 milhões de bolsas mensais, no valor de 120 reais cada uma. Um caso típico, uma vez que os beneficiários não contribuíram com nada para receber o benefício. Citado foi também o seguro desemprego. Errado. Os recursos para pagar o salário desemprego vêm do FGTS, uma contribuição empresarial privada, na envolve recursos oficiais. É preciso raciocinar e distinguir bem os campos de análise.
Não se pode dizer que os recursos oficiais sejam eminentemente assistenciais. Neste ângulo tudo que acontece no país é assistencial, já que todos nós, 195 milhões de seres humanos, agora sim, dependemos diretamente dos acertos e dos erros da administração pública nas várias escalas em que se divide. Sob este critério, não haveria a eterna fronteira entre o que é público e o que é privado. Direito não é benefício. Ele é adquirido através do tempo. E o melhor exemplo de direito adquirido não é o salário: é a propriedade. O salário pode ser interrompido. O bem particular não.
Pedro do Coutto