Defendida em abril deste ano, na Faculdade de Saúde Pública/USP, Érica selecionou um grupo de trinta e oito homens (turno diurno e noturno), todos trabalhadores de indústrias de metais, situadas na cidade de São Paulo.
Do grupo selecionado, a pesquisadora levantou dados de trabalhadores do turno noturno das 21h às 6h e do turno diurno das 7h às 17h, levando em consideração aspectos sociodemográficos, saúde e condições de trabalho, fadiga, sonolência e estresse, coletados por meio de questionários.
O sono desses trabalhadores, que costuma ser muito afetado pelo trabalho noturno, foi acompanhado durante 10 dias seguidos por meio de informações fornecidas pelos trabalhadores e pelo uso de equipamentos de monitoramento próprios para este fim.
Para a realização da pesquisa foram coletadas amostras de saliva desses trabalhadores em momentos diferentes do dia de trabalho. Estas amostras foram analisadas para verificar a concentração de melatonina, hormônio que em seres humanos está relacionado aos ritmos biológicos, ao sono e ao sistema imunológico.
Foi analisado também o cortisol, hormônio liberado em situações de estresse. Estes dois hormônios são bastante alterados pelo trabalho noturno, o que pode trazer prejuízo à saúde dessas pessoas.
Além disso, nessas mesmas amostras de saliva foram dosadas também algumas citocinas inflamatórias, que são moléculas produzidas pelas células durante uma resposta do sistema imunológico a qualquer agressão ao organismo.
As citocinas escolhidas também atuam em processos inflamatórios crônicos, subjacentes a muitas doenças que atingem um número cada vez maior de pessoas, como as doenças cardiovasculares e o diabetes.
Essas doenças ocorreriam com maior frequência entre trabalhadores em turnos. Alterações na produção dessas citocinas devido ao trabalho noturno poderiam estar envolvidas na origem dessas doenças nesta população trabalhadora, e a investigação desta associação foi um dos objetivos mais importantes do estudo da pesquisadora.
Neste estudo, verificou-se um sono mais curto entre os trabalhadores diurnos e os noturnos. Os primeiros dormiram menos principalmente por serem obrigados a começar seu turno de trabalho muito cedo, às 7h.
Já os trabalhadores noturnos apresentavam um estado de dessincronização crônica, isto é, com seus ritmos biológicos em desacordo com suas atividades cotidianas, o que era ocasionado pelo trabalho noturno.
Em função desta dessincronização, os trabalhadores noturnos não conseguem dormir bem e em quantidade suficiente durante o dia. Por tal razão, a pesquisadora concluiu que o trabalho em turnos prejudica o sono desses trabalhadores.
Outro resultado importante foi verificar que a produção das citocinas entre os trabalhadores noturnos estava alterada. Este é um resultado preocupante, pois ao longo do tempo isso pode acabar contribuindo para o surgimento de doenças nesses trabalhadores.
Também se observou que as condições e as tarefas de trabalho contribuíram para a piora da qualidade de vida desses trabalhadores. Estes aspectos subjetivos podem interagir com as variáveis biológicas, favorecendo o aparecimento de doenças.
Por isso, para a pesquisadora Érica Lui, é de extrema importância que nos estudos sobre o mundo do trabalho os pesquisadores adotem uma visão integradora dessas diferentes variáveis, tanto as biológicas quanto as subjetivas.