Cinco pontos podem dificultar o acesso e a manutenção do BPC, que continua sendo servo da regra matemática do 1/4 e passa a exigir inscrição no CadÚnico.
1) O Decreto deixa de prever a possibilidade de utilização de outros meios, além da renda mensal per capita, para a verificação do grupo familiar. Isto é, permanece a regra de 1/4 do salário-mínimo, prevista no art. 20, §3º, da LOAS, declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (Rclm 4374, Min. Gilmar Mendes).
Persiste, então, a postura inconstitucional da Administração. Por consequência, continuaremos a observar excesso de judicialização sobre o tema.
2) O Decreto limita o campo de beneficiários a brasileiros e a portugueses residentes (art. 7º). Os demais estrangeiros continuam sem proteção social básica na via administrativa.
Lembremos que o direito dos estrangeiros ao benefício de prestação continuada consiste matéria com repercussão geral reconhecida pelo STF (RE 587970 RG, Rel. Min. Marco Aurélio).
3) O Decreto expressa que, se não atendido o requisito de renda familiar per capita, o pedido deve ser indeferido pelo INSS, sendo desnecessária a avaliação da deficiência (art. 15, §5º).
Ocorre que os requisitos para acesso ao BPC (carência do grupo familiar e deficiência) se alimentam reciprocamento. Entende-se que uma família é vulnerável também pelo grau de deficiência do interessado, assim como somente é possível perceber o grau de deficiência a partir dos aspectos sociais, familiares etc. Tudo ficou reduzido à matemática da renda mensa (1/4 do salário-mínimo)
4) A inscrição no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal – CadÚnico passa a ser requisito para a concessão, a manutenção e a revisão do benefício (art. 12, “caput”).
Para se obter a inscrição no CadÚnico pode haver grande fila de espera em alguns municípios, e ele é pressuposto até mesmo para a formalização do requerimento do benefício.
Também há o problema de que o conceito de família, para fins de CadÚnico, é distinto daquele adotado para fins de BPC.
E mais: O beneficiário que não realizar a inscrição ou a atualização no CadÚnico, no prazo estabelecido em convocação a ser realizada pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário, terá o seu beneficio suspenso, conforme disciplinado em ato do Ministro de Estado do Desenvolvimento Social e Agrário (art. 12, §1º).
E ainda: O benefício só será concedido ou mantido para inscrições no CadÚnico que tenham sido realizadas ou atualizadas nos últimos dois anos (art. 12, §2º).
5) O requerimento do benefício deve ser realizado pelos canais de atendimento da Previdência Social ou por outros canais a serem definidos em ato conjunto dos Ministros de Estado do Desenvolvimento Social e Agrário, da Fazenda e do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão (art. 15, §1º).
Aparentemente os requerimentos passarão por uma triagem preliminar pelos Centros de Referência da Assistência Social – CRAS (uma espécie de posto de saúde, apenas que com a finalidade assistencial), para apenas depois serem encaminhados ao INSS.
Pelo que se pode verificar, não apenas perdemos a oportunidade de avançar para uma eficiente política de proteção assistencial, como se nota um evidente retrocesso, seja em termos conceituais, seja em termos de acesso a essa política social.