Há, contudo, muitos equívocos nestas notícias. O que está, de fato, tramitando no Congresso é a revogação do parágrafo único do art. 7º da Constituição. Este dispositivo já garantia aos empregados domésticos vários direitos assegurados aos demais trabalhadores como salário-mínimo, irredutibilidade salarial, décimo-terceiro salário, repouso semanal remunerado, férias com acréscimo de 1/3, licenças maternidade ou paternidade, aviso prévio proporcional, aposentadoria e vinculação à previdência social.
No entanto, como se inseria em um artigo mais amplo, que enumerava um amplo catálogo de direitos aos trabalhadores rurais e urbanos, foi sempre considerado como um limitador, como que concedendo direitos a uma categoria distinta.
A extensão dos direitos que já assistem aos demais trabalhadores para os domésticos ocorre por uma via peculiar: através de uma revogação. Revogação que, por deixar de ser exceção, passará a incluir o trabalhador doméstico na dicção do caput do art. 7ª, ou seja dentre os trabalhadores urbanos.
Mas isso pode não ter consequências tão imediatas. A greve dos servidores públicos também estava previsto na Constituição, mas foi preciso a declaração pelo STF em uma ação de mandado de injunção para assegurar a esta categoria de trabalhadores a aplicação das mesmas regras previstas para os trabalhadores comuns.
Direitos como FGTS dependerão, irremediavelmente, de regulamentação por lei. Atualmente a lei que estabelece a vinculação facultativa ao Fundo do trabalhador doméstico é a Lei 10.208/2001 e será necessária uma nova lei prevendo a forma como ocorrerá esta vinculação obrigatória.
Da mesma forma no que diz respeito ao seguro-desemprego ou outros direitos. A Consolidação das Leis do Trabalho não se aplica aos trabalhadores domésticos que têm regramento próprio, a Lei 5.859/72, que se encontra em plena vigência, ali estando previstos, por exemplo, a garantia de emprego da trabalhadora doméstica gestante, dentre outros direitos.
Não imaginem que, no dia seguinte da revogação do parágrafo único do art. 7º constitucional, os empregadores domésticos passarão a ter que contar com um relógio-ponto nas suas portas, ou estarão submetidos ao pagamento de adicional noturno e outros quetais.
O contrato do trabalho do doméstico tem peculiaridades que impedem que normas aplicáveis aos demais trabalhadores sobre ele incidam sem as devidas adaptações, veja-se, por exemplo, a completa inadequação que teria um mandado de reintegração no emprego de um trabalhador estável, considerando-se que o local de trabalho do trabalhador doméstico é a própria residência do seu empregador.
As relações vão mudar, mas não abruptamente e não sem a edição de leis e uma jurisprudência razoável, compatível com as peculiaridades da prestação de trabalho à domicílio.
Bom senso continua sendo o tempero de todas as relações, de trabalho, inclusive.
(*) é juiz do Trabalho da 4ª Região