A condenação de uma empresa que violou os direitos de uma empregada foi reconhecida pela 1ª Turma do Superior sinaliza ao empresariado esta nova modalidade de dano que deverá ser agregada aos já conhecidos danos morais, materiais e estéticos pleiteados nas ações trabalhistas.
Segundo o advogado Paulo Valed Perry Filho, sócio da área trabalhista do Demarest Advogados, o dano existencial surge basicamente de violações de direitos dos empregados como excesso de jornada, mudança nas férias e no descanso semanal remunerado.
“Sob a visão prática, ocorrerá o dano existencial quando o empregador, de forma contínua, dolosa ou culposa, impor um volume excessivo de trabalho ao empregado ou usurpar direitos como impedir o gozo das férias ou do descanso semanal remunerado, de modo a inviabilizar que o trabalhador desfrute do efetivo convívio social, impedindo-o de praticar as suas atividades culturais, recreativas, esportivas, afetivas, familiares, ou mesmo de desenvolver os projetos de vida em todos os seus âmbitos: pessoal, social, profissional e religioso”.
Diferentemente dos danos moral e material, a violação de leis que geram o dano existencial se assemelha muito ao assédio moral, mas o novo instituto reconhecido no julgamento de uma ex-empregada, que ficou nove anos sem usufruir regularmente de férias anuais, é um dano que fere o projeto de vida do trabalhador.
De acordo com Perry, “no assédio moral o empregador exige com certo rigor por parte dos serviços prestados pelo trabalhador: metas agressivas acima de uma razoabilidade. O dano existencial já é inclinado ao quanto à empresa impede o empregado, por meio de violações como as citadas, de usufruir suas relações sociais”, diz Perry.
O advogado diz, que assim como a comprovação de outros danos já amplamente configurados, a condenação por dano existencial requer a comprovação por meios de provas documentais e testemunhais.
“São atitudes repetitivas do empregador que levará o trabalhador à Justiça, por isso, a empresa deve se resguardar tendo um efetivo controle das atividades da empresa, e principalmente desenvolver o treinamento de seus gestores, principais gerentes e dos funcionários responsáveis pelas rotinas de trabalho em cumprimento com as leis.
“A observância das leis trabalhistas e das norma coletivas, associados com um bom trabalho preventivo no âmbito das rotinas trabalhistas das empresas, serão cada vez mais importantes para a redução dos riscos decorrentes das relações de trabalho, especialmente aqueles vinculados ao pedidos de indenização por danos morais, materiais, estéticos e existenciais”, diz o especialista.
De acordo com Perry, no caso julgado pelo Tribunal Superior do Trabalho é explícita a privação do projeto de vida da ex-funcionária. “Uma pessoa que fica nove anos sem tirar férias tem um prejuízo nas relações sociais, e nesse contexto podemos imaginar que ela foi privada de viajar com a família, de fazer um curso, e até mesmo deixar seu convívio de âmbito religioso, cultural”, diz o advogado.
Para fundamentar a decisão, os Ministros que compõem a 1ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho consideraram que a supressão deste direito ao gozo regular das férias prejudicou o convívio social da trabalhadora, suas relações sociais e frustrou os projetos de vida da autora da ação.
Segundo o acórdão do Tribunal a conduta do empregador violou o artigo 5º, inciso X, da Constituição Federal que dispõe sobre a inviolabilidade a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurando a indenização por dano moral ou material decorrente de sua violação.
As explicações contidas no próprio texto do acórdão delineiam que o dano existencial decorre da conduta ilícita dos empregadores ao impedir o empregado de usufruir, ainda que de forma parcial, das variadas relações sociais existentes fora do ambiente do trabalho, sejam estas relações familiares, recreativas, culturais e outras extralaborais, ou seja, que impossibilite a efetiva integração do trabalhador à sociedade, frustrando os projetos de vida da pessoa e violando, em última análise, o direito da personalidade do indivíduo.
O advogado destaca que a decisão do TST decorre de uma reclamação trabalhista que tramita na 2ª Vara do Trabalho de Campo Grande, Mato Grosso do Sul, mas que outros magistrados e Tribunais do Trabalho já se manifestaram recentemente sobre o tema, especialmente em Porto Alegre e Goiás.
“Em verdade, o direito de reparação pela violação de dano existencial, também denominado de “dano de projeto de vida”, já foi reconhecido pela Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), em 1998, e pela novas sinalizações das decisões dos tribunais de todo país, também passará a ser cada vez mais admitido e aplicado em ações trabalhistas em todas as instâncias da Justiça”, diz Perry.